Quando eu era pequena ia ao Centro de Umbanda que minha avó participava, onde todos se vestiam de branco, tinha um cheiro de incenso incrível porque um negro simpático defumava o ambiente antes das pessoas entrarem, um grande Jesus no centro, algumas tábuas onde se riscava em giz estrela e outras formas, eu tomava passe, batia a cabeça no chão próximo ao altar como em reverência... ao fundo do centro, onde os médiuns se trocavam tinha um outro altar, com várias miniaturas: preto-velho, são jorge, e outros que não me recordo. Algumas oferendas como flores e balas de mel. Além disso, nesse local eram realizados eventos beneficentes, dos quais me recordo o Dia das crianças, com brinquedos, bolo e festa. Então essa semana, passando por uma loja que vende artigos religiosos uma santa me chamou atenção e fui tirar uma dúvida. A Senhora fez referência ao Candomblé e me gerou a dúvida: a diferença entre Umbanda e Candomblé e suas peculiaridades.
Esse artigo trata sobre cultos africanos no Brasil e especialmente a diferença entre a Umbanda e o Candomblé. Busca-se informar sobre esses cultos praticados no Brasil como forma de manifestar a diversidade e preservar a cultura brasileira.
A Constituição Federal do Brasil determina no art.215, §1: “O Estado protegerá as manifestações das culturas populares, indígenas e afro-brasileiras, e das de outros grupos participantes do processo civilizatório nacional.” Trata-se, aliás, de um direito fundamental descrito no art.5º VI da CF/88 “é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias;”
Sem partidarismos, o Presidente Lula certa vez afirmou por ocasião do Festival Mundial das Artes Negras em 2010: "A África não está apenas na pele dos brasileiros, mas na alma de todos nós. Por isso, o governo federal estimulará a participação dos nossos artistas no festival. É uma maneira de homenagearmos um continente que ajudou o povo brasileiro a ser como somos: alegres, batalhadores e com alma grandiosa".
Os cultos de origem africana são diversos: CANDOMBLÉ, VUDÚ, HOODOO, PETRO, RADA, LUCUMÍ, SANTERÍA, PALO-MAYOMBE, UMBANDA, QUIMBANDA E CATIMBÓ.
A preservação dos cultos, cada um com suas peculiaridades, garante a fidelidade e o respeito à cultura africana e afro-brasileira.
Para começar, cito: o Candomblé, o Vudú, a Santería, o Palo-Mayombe e o Lucumí são cultos muito semelhantes, de origem africana, mas tremendamente desenvolvidos nas Américas. Já a Umbanda é um culto muito distinto, com bem poucas semelhanças com os outros dois, enquanto a Quimbanda é algo totalmente diferente. O Catimbó é uma espécie de meio-caminho entre a Umbanda e a Quimbanda. O Hoodoo reúne características do Vudú, porém tem diversas peculiaridades, sendo a mais importante delas trabalhar apenas com Elementais, Elementares, Sombras, Cascarões, Larvas e "Almas". Petro e Rada são duas raízes diferentes do Vudú haitiano, sendo o culto Rada mais voltado às Entidades do panteão Afro original, enquanto o Petro é mais voltado ao culto de Loas semelhantes aos Guias de nossas Umbanda e Quimbanda. O Voudon Gnóstico, apesar do nome, e da nítida influência do Vudú e do Hoodoo, é mais uma Ordem Hermética (uma vez que é ligado à O.T.O.A. - Ordo Templi Orientis Antiqua) do que um culto ou uma religião, razão pela qual está fora deste texto. Todos, porém, tem entre si uma semelhança marcante e de suma importância: são todas "Religiões Thelêmicas", ou "Cultos Thelêmicos", como queiram. E o que significa uma religião ser "Thelêmica"? Significa que cada indivíduo, dentro dela, tem sua própria religião, seu próprio Deus, distintos dos de qualquer outro indivíduo. E foi por isso que os cultos africanos sobreviveram na mudança para o novo mundo, cresceram e se multiplicaram. Leia mais neste site.
Considerando a Umbanda e o Candomblé as práticas de origem africana mais comuns no Brasil, forneço a seguir alguns dados sobre a quantidade de praticantes no Brasil.
No censo de 2000, em uma população que ultrapassa 160 milhões de habitantes, pouco mais de 525 mil pessoas se declararam adeptas do Candomblé e da Umbanda, embora outros tantos milhares de não-adeptos freqüentem terreiros e tendas como “clientes”.
Os dados também revelaram que existem mais Umbandistas que “candomblezistas”…
[Umbanda: 397.431 ─ Candomblé: 127.582, em universo onde mulheres são a maioria]
(Informação retirada deste site)
No censo de 2010 o IBGE classificou algumas religiões e uma das categorias tratou indistintamente “umbanda, candomblé e outras religiosidades africanas”.
“No que tange à umbanda verifica-se que parte importante dos que se declararam pertencentes a essa religião são residentes nos Estados do Rio Grande do Sul, do Rio de Janeiro e de São Paulo enquanto que entre aqueles que professavam a religião candomblé, grande parcela situava-se no Estado da Bahia, especialmente em Salvador e municípios próximos, e também no Estado do Rio de Janeiro (Cartograma 6).” (Relatório IBGE 2010)
Há divergência quanto ao número de adeptos. A Federação Nacional de Tradição e Cultura Afro-Brasileira (Fenatrab) desafia ostensivamente as cifras oficiais e garante haver 70 milhões de brasileiros, direta ou indiretamente, ligados aos terreiros — seja como praticantes assíduos, seja como clientes, que ocasionalmente pedem uma bênção ou um “serviço” ao mundo sobrenatural.
“Em 2001, Ricardo Mariano, analisando o crescimento evangélico, em sua tese de doutorado, fez uma descoberta sensacional. Descobriu que as religiões afro-brasileiras estavam perdendo fiéis… E apontou como razão o enfrentamento com as igrejas pentecostais [[os evangélicos, até porque os pastores se apropriaram de rituais do candomblé ou adaptaram esses rituais como odescarrego, o banho com a rosa branca, os passes e juntaram tudo isso com o apelo à figura de Jesus Cristo!]. …Pode-se ver que a perda de fiéis do conjunto afro-brasileiro se deve ao encolhimento da Umbanda. Como o pequeno crescimento do Candomblé não é suficiente para compensar as perdas umbandistas, o conjunto todo se mostra, agora, debilitado e declinante diante do avanço pentecostal.” [PRANDI, José Reginaldo. P. 17-18]
Passemos às diferenças entre Umbanda e Candomblé.
Primeiramente a diferença etimológica.
Candomblé é uma palavra derivada da língua bantu: ca [ka]=uso, costume, ndomb=negro, preto e lé=lugar, casa, terreiro e/ou pequeno atabaque. A reunião dos três vocábulos resulta em "lugar de costume dos negros", por extensão, lugar de tradições negras, tradições entre as quais, destacam-se, no sentido atual as práticas religiosas que incluem a música percussiva [A TARDE, 1980]. Outra interpretação informa que kandombele significa "adorar" [Ngunz'tala, 2006]. Outra fonte afirma: O termo "candomblé" é uma junção do termo quimbundo candombe (dança com atabaques) com o termo iorubá ilé ou ilê (casa): significa, portanto, "casa da dança com atabaques". (CUNHA, A. G. Dicionário etimológico Nova Fronteira da língua portuguesa. 2ª edição. Rio de Janeiro. Nova Fronteira. 1982. p. 146)
A palavra Umbanda é derivada de “u´mbana”, um termo que significa “curandeiro” na língua banta falada na Angola, o quimbundo. A umbanda tem origem nas senzalas em reuniões onde os escravos vindos da África louvavam os seus deuses através de danças e cânticos e incorporavam espíritos. Outras fontes dizem que a palavra é a união de 3 radicais, ou AUM-BAN-DAN, que significa “O Conjunto das Leis Divinas”.
A diferença da origem dos cultos:
A começar pelas origens, o Candomblé é uma religião africana que existe desde os tempos mais remotos daquele continente, que é o berço da terra, de forma que se funde sua origem com os primeiros contatos de pessoas que lá chegaram. No Brasil o Candomblé obteve contribuições de diversas nações africanas para a formação do panteão principal: os bantu, nativos de Angola, Moçambique, Congo; Gana, Benin, Nigéria [Ioruba ou Nagôs]; Sudaneses, da Costa do Marfim, os Ewe, muitos, muçulmanos; os Fon e os Ashanti. Todos esses, falando línguas diferentes e cultuando seus próprios deuses.
A Umbanda, como religião, é brasileira. A Umbanda que se pratica em Angola se difere da Religião de Umbanda, embora guarde algumas semelhanças. Basta considerar o fato de que a religião é reconhecida como algo brasileiro, resultante do encontro de três raças e muitas culturas, para, facilmente, diferenciá-las - Africana, indígena e catolicismo. A Umbanda que se pratica em Angola não constitui culto aberto e coletivo, antes se reserva a práticas mais particulares e restritas. Logo, uma mesma palavra passa a ter um novo significado.
As distinções entre o Candomblé e a Umbanda decorrem de três fatores: a natureza das entidades cultuadas; os procedimentos do culto e pelos componentes do sincretismo.
A Diferença das entidades cultuadas:
No Candomblé, os cultuados, os Orixás [ou Orijás] são considerados deuses - Esse panteão, atualmente, é composto de 16 orixás [ou Òrìsà, em ioruba] principais, numa significativa condensação das forças metafísicas que levou mais de um século para se definir no processo de integração das diferentes nações cujos representantes chegaram ao Brasil durante o período da escravidão. Não obstante, "correndo por fora", contam-se ainda, outros 14 orixás reconhecidos em diferentes centros de culto.
Com sua teologia repleta de controvérsias o candomblé, em muitos centros de culto, como mencionado acima, admite apenas 12 orixás excetuando Oxalá, o outro nome para Olorum, o Deus Supremo. Esses 12 são:
01.Exú [Esú];
02.Ògùn [Ogum]
03.Osòòsi [Oxossi]
04.Ôsumarê [Oxumaré]
05.Obalúwaiyé [Obaluaye ou Omolu]
06.Ósanyin [Ossaim]
07.Sàngó [Xangô]
08.Ôsum [Oxum]
09.Oya [Iansã]
10. Lògún Odé [Logunedé]
11. Nanã
12.Yemoja [Yemanjá]
Na Umbanda, ainda que o culto também invoque e evoque Orixás, estes são considerados meros espíritos ancestrais mais antigos ao lado de numerosas outras entidades representativas de ancestrais mais modernos e/ou contemporâneos. No Candomblé, os deuses, desde de sua origem em terras africanas, também são ancestrais porém sua antiguidade remonta a tempos imemoriais.
Na Umbanda as consultas são feitas através da invocação dos espíritos de caboclo, preto-velho (guia espiritual retratado na imagem abaixo), baiano, exú, etc. Mas nota-se muito o uso do sincretismo com o uso de santos católicos e da figura de Jesus, confome é possível ver abaixo.
A Diferença dos Rituais:
No Candomblé as consultas são feitas através do "jogo de búzios" ou "Ifà", não aceitando a comunicação de espíritos (eguns), sendo portanto vetada sua incorporação, os trabalhos mediúnicos de incorporação. No Candomblé a consulta é feita através da leitura esotérico/divinatória do jogo de búzios (no Brasil), forma de leitura exclusiva do povo candomblecista e o tratamento para cada caso, é feito com elementos da natureza, oriundos dos reinos vegetal, animal e mineral, através e ebós, oferendas, Orôs (rezas) e rituais africanos.
A Umbanda não tem orixás, na umbanda tem essas imagens, que é nosso pai Oxalá, tem Caboclo, Preto Velho, Iemanjá, as imagens que, dentro da igreja católica são São Gerônimo, Santa Bárbara, Nossa Senhora Aparecida, Nossa Senhora do Carmo, São Jorge, que é ogum. Isso cultuamos na Umbanda”, explica Walmir de Omulu, pai de santo.
Leia mais neste site.
A Diferença do idioma dos cânticos:
No Candomblé os cânticos são em línguas africanas (Iorubá como no canto acima - ou Banto), dependendo da nação de origem daquele grupo. Os cânticos da Umbanda, chamados pontos, são em português. Ouça no vídeo.
A Diferença do Local de realização:
No Candomblé - Terreiro (do latim terrarium[1] ) nos cultos afro-brasileiros, é o local onde se realizam os cultos cerimoniais e são feitas oferendas aos orixás.[2] Embora nem sempre de terra batida, o nome permanece como referência aos barracões e quintais onde as celebrações eram realizadas, também chamado de roça. E Barracão onde são realizadas as festas públicas.
Na Umbanda - Congá é o local onde ocorrem as incorporações das entidades. Para entrar no conga deve-se tirar os sapatos em respeito ao solo, que é sagrado. A cerimônia, chamada de gira, começa à noite, por volta das 20 h, e, quando os fiéis chegam, os médiuns já estão lá, incluindo o sacerdote começa com a defumação: ervas como alecrim são queimadas num braseiro. O ritual, que purifica e passa energia, é acompanhado de ponto cantado - todas as cantigas são chamadas de pontos na umbanda.
Outras características:
Na Umbanda só se "trabalha" para o bem (em contraposição à Quimbanda). As Entidades que "baixam" na Umbanda são somente benéficas. Em alguns "terreiros" de Umbanda foram implantados "Rituais Iniciáticos", herdados de culturas diversas. Na Umbanda, vê-se uma nítida influência do Kardecismo, bem como da mentalidade católico-cristã, além do público e notório sincretismo religioso entre os Orixás da Umbanda (que só comungam dos nomes com os Orixás do Candomblé) e os Santos Católicos.
Existem 7 linhas de Umbanda:
I. LINHA DE OXALÁ [Liderada por Jesus Cristo] ─ Falanges: 1. Santo Antônio | 2. São Cosme e Damião ["espíritos-crianças", não necessariamente infantes mas, antes, Espíritos com mentalidade infantil] | 3. Santa Rita | 4. Santa Catarina | 5. Santo Expedito | 6. São Francisco de Assis. Esta Linha dedica-se a desmanchar trabalhos de magia.
II. LINHA DE IEMANJÁ [Liderada por Oxun] ─ Falanges: 1. Ondinas de Nanã | 2. caboclas do Mar | 3. Indaiá dos Rios | 4. Iara dos Marinheiros | 5. Tarimã das Caluga-Caluguinhas da Estrela Guia.
III. LINHA DO ORIENTE ─ Falanges: Hindus, árabes, chineses e outros orientais além de europeus. Dedicados à medicina.
IV. LINHA DE OXOSSI ─ Falanges: 1. Urubatão | 2. Araribóia | 3. Caboclo das Sete Encruzilhadas [aquele do fundador Zélio Fernandino] | 4. Águia Branca. Indígenas, caboclos, são curandeiros que protegem contra magia e ministram passes, prescrevem ervas medicinais em preparados para banhos, defumações ou uso tópico. Estes preparados são chamados amacys.
V. LINHA DE XANGÔ ─ Falanges: 1. Iansã | 2. caboclo do Sol | 3. Caboclo da Lua | 4. Caboclo Pedra Branca | 5. Caboclo do Vento | Caboclo Treme Terra. Pela característica do orixá que dá nome à linha, supõe-se que atue em casos de problemas judiciais, demandas, litígios.
VI. LINHA DE OGUM ─ Falanges: 1. Ogum Beira-Mar | 2. Ogum-Iara | 3. Ogum-Megê | 4. Ogum Rompe-Mato. Estas falanges tratam das brigas, das situações de disputa pessoal, discórdias.
VII. LINHA AFRICANA ─ Falanges: 1. Povo da Costa | 2. Pai Francisco | 3. Povo do Congo | 4. Povo de Angola | 5. Povo de Luanda | 6. Povo de Cabinda | 7. Povo da Guiné. Esta falange dedica-se à prática do bem em geral e, ao que tudo indica, dentro da confusa divisão das Linhas e Falanges, esta linha africana possivelmente inclui a chamada Falange ou seria [sub-falange?] dos Pretos-Velhos e a das Almas [que o estudo comparado indica ser sinônima da Falange Povo de Angola].
Para cada Orixá Superior e cada Orixá menor existem inúmeras correlações que são utilizadas nas práticas rituais das Giras [sessões]: minerais, figuras geométricas, signos zodiacais, dias da semana, horas vibratórias, perfumes, flores, ervas que são usadas em banhos, remédios e defumações, cores e arcanjos tutores. Se este artigo contivesse o nome de todos os caboclos, seria uma lista telefônica de metrópole; e se fossem indicadas todas as relações de atributos, seria um livro... um "tijolo". Para quem realmente desejar conhecer em detalhes essa Hierarquia, suas relações e atributos, o melhor é procurar o livro Ponto de Convergência: Fundamentos e Práticas de Umbanda, de Eduardo Parra.
Veja, por exemplo, as cores das guias (colares) correspondentes a cada Orixá:
Ao longo do tempo, a umbanda passou por transformações e foi se demarcando de outras religiões. Também criou ramificações, algumas delas são descritas como: Umbanda Tradicional: criada no Rio de Janeiro pelo jovem Zélio Fernandino de Moraes; Umbandomblé ou Umbanda Traçada: onde um mesmo sacerdote pode realizar sessões distintas de umbanda ou de candomblé; Umbanda Branca: utiliza elementos espíritas, kardecistas e os adeptos usam roupas brancas; Umbanda de Caboclo: forte influência da cultura indígena brasileira.
Enfim, essas são algumas das várias diferenças dessas duas religiões. Cada um com sua fé, somando um país melhor, com amor e paz.
Viva à diversidade!
Maravilhoso seu site, lindo trabalho, Parabéns
ResponderExcluirParabéns! Muito esclarecedor. Axé o!
ResponderExcluircomo funciona os direitos autorais das imagens dessa pagina?
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